segunda-feira, 26 de julho de 2010

Sonhos, planos, fantasias

-Domingo. Dia de sol. O céu era completamente azul. Sem nenhuma nuvem. Os pensamentos podiam vagar livremente. Sem presa. Lentamente. Escorrendo como água. Dissolvendo-se e formando-se mais uma vez. Nenhum som. Nenhum barulho. Ao longe, uma melodia. Que no silêncio daquela tarde podia ser ouvida. Agradável. Simples. Emocionante. Era uma melodia, tocada num rádio qualquer. Que alguém qualquer ouviria e cantaria, se soubesse a letra. Música. Música mexe com a alma. Fala com o corpo. Entra em lugares que não se conhece. Música trás palavras. Enche vazios. Esvazia cheios. E naquela tarde de domingo, lá fora, ela ouvia a música que vinha de longe. Mexia tanto com ela a letra. A intensidade do som. A vibração do ar que vinha carregado de canção. Fechou os olhos. Sentiu somente. Era dela. Era para ela. Naquele momento ali. Sentada em sua cadeira. Sentiu tantas emoções juntas que não poderia descrever nenhuma. E a sonoridade das notas penetrava em cada poro. Contagiando-a. A melodia era triste. Só que não seriam mais belas, as melodias tristes? Mais sentimento. Um sentimento verdadeiro. E a tristeza é melâncolia. E melâncolia é uma forma romântica de se ficar triste. Ela aquietou o espírito. E ouviu a letra toda. A canção inteira. Até seus sons se perderem no ar. E com toda sua paixão. Escreveu dois versos no caderno próximo.

"Tantos amores a passar por nós, todas as canções e as poesias..."

E dessa tarde, foi somente isso que ficou. Além da lembrança do sentimento. E da letra da música.

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Não foi possível postar uma imagem. Uma pena. Tinha uma bonita.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Volta


-A campainha de aviso dos pilotos soou alto. Fazendo-a acordar com um sobressalto. Diziam, mais uma vez, que o voo atrasaria devido ao mal tempo. Ela simplesmente olhou de relance o relógio de pulso. O que seriam algumas horas, comparado ao longo tempo que havia esperado. Foram seis meses. Seis meses de uma experiência inesquecível. Seis meses de alegrias. Surpresas. Acertos. Erros. E de saudade. Não somente de seu país. Do sol constante. Da familiaridade das paisagens. Da receptividade do povo. Mas dos pais, dos amigos, do irmão. E dele. Quando a imagem nítida dele surgiu em sua mente, ela se arrumou melhor na poltrona puxou para mais perto do rosto as cobertas. Pronta para enxugar qualquer lágrima. Não que ela houvesse deixado-o para trás. Abandonado-o. Esquecido-o. Ela havia viajado. Partido. E ele, permanecido no mesmo lugar. Fora difícil no começo. No meio. No fim. A falta machucava como agulha que espeta constante a pele. E as dúvidas. Sempre as dúvidas. De não suportar a falta. Do amor não durar. De outra pessoa aparecer. De ele descobrir que não bastava somente telefonemas curtos e cartas. E os medos. Medo de perde-lo. Medo do amor ser pouco e o tempo ser muito. 180 dias. 180 dias sem contato físico. Sem toques. Sem olhos nos olhos. Incomodada com esses pensamentos, mais uma vez, se arrumou na poltrona. Havia demorado para decidir se iria. Deixara para a última hora. Por fim, quem incetivara fora ele. E ela foi. E agora estava de volta. Quase de volta. Quase no chão de seu país. Não negava. Aprendera muito. A viagem foi essencial para sua formação. Pessoal. Profissional. Mas o buraco no peito era enorme. Queria ve-lo. Sabia, mais do que nunca que o amava. E sabia também, por mais que houvesse dúvidas que quando o avistasse sorrindo para ela no aeroporto tudo estaria exatamente igual. O mesmo amor. E até mesmo maior. Um amor maior. Faltava um hora para o fim da viagem. Se aconxegou na poltrona e imaginando o abraço que receberia, dormiu. Um sorriso tranquilo permaneceu em seu rosto.
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Sem mais.

domingo, 18 de julho de 2010

Classificar


-É estranho o que a gente pode sentir longe de uma pessoa. E eu não falo somente de saudade. A saudade se tem quando bate um frio gelado e não há braços para esquentar. Quando nasce um dia lindo e não se tem para quem contar. Quando se quer beijar e não há boca. E um dia teve. E um dia houve. Aquela boca. Aqueles lábios. Não, não falo somente de saudade. Falo de um sentimento maior, e mais angustiante que a própria saudade. Alguma coisa que segura o coração com duas mãos e o aperta. Alguma coisa que não te deixa vagar com o pensamento. Porque o pensamento fica do outro lado. Naquela pessoa que falta. Isso - esse sentimento que é maior que a saudade - aperta mil vezes mais, consome mil vezes mais. E tira lágrimas. Lágrimas por faltar o beijo de boa noite. Lágrimas por faltar o som da voz no ouvido. Lágrimas pelas vezes em que se queria estar junto e não se pode. Culpa da distância. A distância que faz surgir esse sentimento sem nome. Mais intenso que saudade. Mais forte que a dor da perda para sempre. É a ausência quando se sabe que a pessoa ainda existe. Só está longe. E eu sinto que posso chamar isso por dois nomes. Classificar, diria. Ou é obsessão. Pura e simples. Ou é amor. Intenso e verdadeiro. Eu, pessoalmente quero achar que é a segunda opção. Eu acho que é a segunda opção.
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Imagem de Henrique Godoy
Pode ser que o texto nada faça sentido com a foto, mais é assim mesmo. Para mim, as vezes, quando nada parece fazer sentido, é ai que tudo se encaixa. Perfeitamente.
Nota: Vou parar com esses textos reflexivos e saudosistas. Vou parar... É fase.
contemplarthais.blogspot.com -----> dica de leitura!

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Quando tudo um dia se for



-Há cartas. Há cartas escritas e empoeiradas em uma gaveta qualquer. Fechadas e amareladas. De tempos atrás. De ontem e de hoje. São cartas que nunca foram enviadas. Que nunca chegarão a um destinatário. Que nunca receberão selos e carimbos. São cartas que falam de amor. Que contam uma história bonita de amor que no tempo se perdeu. E com o tempo também esqueceu-se o calor dos abraços. O toque das mãos. O sabor dos lábios. Com o tempo perdeu-se a intimidade, a amizade, o compartilhar. Com o tempo os olhos ficaram secos, vazios, indecifráveis, distantes. O tempo levou tudo isso. Só não levou as cartas. Ainda há cartas. E elas contam o amor que um dia foi. Que um dia existiu. Elas contam de lembranças esquecidas e brincadeiras que se acabaram. Contam de dias de sol, agora amarelados, e juras eternas já várias vezes repetidas. De tudo isso, sobraram somente os papéis. A caligrafia bem elaborada. Datas sem sentido e velhos envelopes. Mas são cartas que nunca foram enviadas. Que permaneceram guardadas. Juntamente com o amor que prometiam. No fim, quando tudo se for, até a lembrança desse amor, ainda restarão as cartas. Haverá cartas de amor. Sempre. Sempre existirão.

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Inspirado no poema "Todas as cartas de amor são ridículas" de Álvaro de Campos - Fernando Pessoa.



Foto de Henrique Godoy - Agradecimentos por me permitir usar uma de suas maravilhosas fotos. Futuramente talvez haja uma parceria (quem sabe?).
www.flickr.com/godoypk

domingo, 11 de julho de 2010

Nostalgie



Quando meus versos não são suficientes. Quando me faltam palavras. Quando mais um texto seria triste e angustiante. Quando já não sei o que dizer nem como dizer. Recorro a outros melhores que eu. Que definem melhor do que eu esse sentimento que provavelmente cada um sinta de um jeito.

-"A saudade é a nossa alma dizendo para onde ela quer voltar."
Rubem Alves

-"Saudade é ser, depois de ter."
Guimarães Rosa

-"Saudade é não saber. Não saber o que fazer com os dias que ficaram mais compridos, não saber como encontrar tarefas que lhe cessem o pensamento, não saber como frear as lágrimas diante de uma música, não saber como vencer a dor de um silêncio que nada preenche."
Martha Medeiros

-"Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas às vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco: quer-se absorver a outra pessoa toda. Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida."
Clarice Lispector

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Dicionário escolar da língua portuguesa:

Saudade : recordação ao memso tempo triste e suave de pessoas ou coisas distantes o u extintas, acompanhada do desejo de tornar a vê-las ou possuí-las; pesar, pela ausência de alguém que nos é querido; nostalgia.

Deu para entender? Eu ainda não entendo, só sinto.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Separação


O céu amanheceu azul naquele dia. Azul brilhante e alegre. Indiferente a todo e qualquer tipo de outro sentimento, que não fosse felicidade. Manhã perfeita para se fazer qualquer coisa. Manhã perfeita para sorrisos. Manhã perfeita para caminhar de mãos dadas por qualquer lugar. Mas, não era exatamente isso que ela iria fazer. Não era exatamente alegre o que ela iria fazer. Não era exatamente agradável. Toda despedida não é totalmente agradável. Toda despedida antecipa a saudade, antecipa a falta, antecipa a melâncolia e a dor. Toda despedida antecipa também, as lágrimas. Olhou pela janela e viu o céu azul. Limpou com o dedo as finas lágrimas. Ainda não era hora para isso. Olhou pelo apartamento. Fazia somente 3 meses que havia morado ali, só que nada tirava a sensação que haviam sido anos. 3 meses de tantos acontecimentos. De tantas mudanças. Agora, mais uma vez, era a hora de um descanso. Férias. Voltar para a casa dos pais. Para a cidade na qual havia nascido. Na qual havia em cada canto uma parte de sua história e vida. Tudo bem voltar quando não se deixa nada para trás. Tudo bem. Só que ela estava deixando muito. Estava deixando o coração. Estava deixando o próprio corpo, a própria alma. Respirou fundo e conferiu a bagagem. Tudo estava certo. Acrescentou alguns objetos de ultima hora. Amontou tudo no meio da sala exatamente quando o taxi soou a buzina no portão. Pegou as malas. Fechou a porta. Desceu as escadas. Entrou no taxi - "Rodoviária, por favor." No caminho a sensação de querer voltar para casa, mais de querer também permanecer. Não era justo. Deixar para trás ele. Não era justo, logo agora terem que se despedir. Não era justo deixa-lo ir também. Não era justo ela ir. O coração estava em pedaços, e mais uma vez as lágrimas finas voltaram. É claro que ele estava esperando na rodoviária. É claro que se abraçaram como se fosse a última vez. É claro que se beijaram como se o mundo houvesse parado. Só que, apesar de tudo isso, a falta seria uma constante. A falta e o medo de quando ela voltasse tudo estar diferente. Não ser mais a mesma coisa. Não passar de um truque da imaginação. Tentou afastar esses pensamentos. Olhou nos olhos dele, era hora de embarcar. Mais um beijo. Mais um abraço. Enfim, adeus. Pela janela do onibus ela ainda pode ve-lo na plataforma. Um beijo jogado. Um sorriso apagado. Dois olhos tão sinceros. Ela o amava tanto. Ainda podia ve-lo na plataforma quando, mais uma vez, as lágrimas apareceram. Não eram mais finas. Mas surgiram na hora certa. Agora sim poderia chorar. Agora sim.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Sem palavras


-Já não há a antiga necessidade. Já não sinto que as palavras me oprimem e pedem e clamam para sair. Reina um completo silêncio dentro de mim. E sinto as palavras congeladas. Elas não fluem como antes. Agora escorrem vagarosamente, grudam e obstruem a onda que viria atrás. Desconheço o motivo. Talvez meus olhos estejam finalmente fechados. Fechados para a eterna novidade que é o mundo. Ou talvez os meus lápis e canetas tenham pedido um descanso. O fato é que não há mais a antiga necessidade. Necessidade que encheu páginas e posts. E folhas de caderno. É certo que sentirei falta. Mas devo por hora parar. Não forçarei. Assim como não retive quando tudo isso veio. Quero que volte e sei que vai voltar. Por enquanto é isso. Silêncio. Branco. Mas nunca abandonado.